Regulamentação de duplicatas pelo BC deve impulsionar crédito a PME
A ampliação de crédito, especialmente, para pequenas e médias empresas (PME), pode vir da regulamentação das duplicatas escriturais pelo Banco Central (BC), que representa recebíveis de vendas a prazo.
Apesar das estimativas, o setor vê potencial de R$ 15 trilhões por ano em duplicatas, com até metade disso podendo ser convertido em operações de crédito.
Vale destacar que o desconto de duplicatas é muito usado por pequenas empresas para se financiar. No entanto, a falta de transparência inibia a oferta de recursos por bancos e investidores, o que acaba deixando o mercado aquém do seu potencial.
Atualmente, não existem dados consolidados sobre o segmento. De acordo com informações do BC, no mês de julho, o estoque de operações de desconto de duplicatas e recebíveis estava em R$ 158 bilhões, queda anual de 5,8%. A modalidade foi afetada pelo choque no crédito depois do caso Americanas.
Entretanto, esses números compõem apenas parte dos negócios desconsiderando, por exemplo, duplicatas dadas em garantia em outras operações, até mesmo o que é negociado em fundos de investimento em direitos creditórios (FIDCs).
Vale ainda dizer que, apesar do potencial, o impacto no mercado não será imediato, dado que o processo de implementação será longo.
Os textos publicados pelo BC e pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) acabam dando o passo inicial para a entrada em vigor, porém as etapas se estenderão pelos próximos anos e, se todos os prazos máximos forem usados, terminarão apenas em 2027.
Vale lembrar que a criação das duplicatas escriturais aconteceu por meio de lei em 2018, uma vez que, anteriormente, só haviam os títulos mercantis.
Regulamentação
A regulamentação da autarquia veio em maio de 2020, no entanto, por conta da entrada conturbada em vigor do sistema de registro recebíveis de cartão, em junho de 2021, o BC regulador optou por dar “um passo atrás” no caso das duplicatas. O mercado aguardava esse complemento das regras desde o fim de 2022.
Com relação a regulação, ela reflete aprendizados trazidos pelo sistema de cartões e traz detalhamentos sobre:
Conciliação;
Contestação;
Portabilidade;
Extensão dos efeitos dos contratos;
Liquidação.
Além disso, o texto direciona sobre um ponto ainda em aberto nas discussões de cartões, as tarifas de interoperabilidade praticadas entre as registradoras, isto é, quando trocam informações entre si.
A nova regra escalona a implementação, assim como aconteceu nos cartões, em que a mudança para o novo sistema foi feita de uma só vez e o mercado acabou bloqueando devido a problemas tecnológicos.
Do outro lado, inclui aperfeiçoamentos que foram incorporados ao sistema de cartões desde que foi lançado.
Assim, o próximo passo envolve a aprovação da convenção das escrituradas. As interessadas devem enviar o texto ao BC até o fim de 2023.
Testes
Os processos começarão com unicidade, passando por agenda, contratos e portabilidade. Passado o período de testes, as empresas de grande porte terão 180 dias para se adequar. As médias terão 360 dias e as pequenas, 540 dias.
Com mais informações disponíveis, espera-se que haja um aumento nas concessões e também das instituições interessadas em financiar operações, com maior atuação de fintechs no segmento.
Para o CEO da CRDC, Ivan Pompeu, além de atuar no registro, com a implementação do novo modelo, as escrituradoras terão funções comparáveis às atribuídas a credenciadoras no setor de cartões.
Pompeu ainda acrescenta que a escrituração melhorará o fluxo de caixa das empresas, facilitando a vida de quem comprou o produto ou serviço e precisa quitar a dívida.
“Os processos ficarão mais dinâmicos e transparentes”, diz Pompeu.
O CEO da Cerc, Fernando Fontes, observa que já houve grande interesse das empresas na nova sistemática, até antes da obrigatoriedade. Segundo ele, é possível que algumas das fases criadas pelo BC sejam antecipadas.
Além disso, os participantes destacam que as novas regras da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que estabeleceram que FIDCs deverão registrar os seus recebíveis, trarão parte do mercado para o sistema.
“Os trabalhos têm sido bem intensos desde 2020 e estão bem adiantados. Nossa expectativa é começar a operar no sistema logo que for liberado”, diz o responsável pela área de relações institucionais da Tag, Lucas Leão Calumby.
Apesar de a regulação de duplicata ter se inspirado na de cartões, no ponto das tarifas de interoperabilidade, ela está à frente, diz Fontes.
“O BC define as premissas para a estrutura e acho que isso também terá que ser levado em conta na discussão de cartões”, afirma.
Conforme o texto, o regulador diz que a cobrança precisa considerar a recuperação dos custos operacionais e de capital associados ao serviço.
Atualmente, o modelo em vigor é o de preços próprios, em que cada registradora tem liberdade para definir seus valores, porém é necessário cobrar na interoperabilidade o mesmo que cobra do seu cliente.
Agora, as empresas caminham para um modelo de ressarcimento de custos, sejam operacionais, sejam de capital, após um longo embate e o auxílio de uma consultoria.
Anteriormente, a inclusão de custos de capital era um ponto que gerava discordância entre as registradoras, no entanto foi considerada necessária para que as discussões avançassem.
No texto das duplicatas, a autarquia dá orientação para definir o modelo e valor das tarifas, também considerando a discussão nos cartões.
Fonte: Contábeis